Sr. Marback,

Perdoe-me a demora. Mas, como havia informado, estou de passagem em Londres para resolver algumas pendências. Não estou hospedada em casa de tua tia, o que não me permitiu receber tua carta anteriormente. Apenas tenho ido até lá para averiguar algumas coisas.
Acontece que nestas últimas semanas eu não pude comparecer à residência de nossa querida Lílian. Estive em Spitalfiels, visitando meu bom e velho pai. Ele não pode trabalhar desde que amputou a mão direita em um acidente que, diga-se de passagem, até hoje creio ser demasiado estranho. Viúvo, só tem a mim. E como não pude fazer muitas visitas desde que estive ao lado de Lílian, aproveitei a estadia para fazê-lo.
Achei interessante chamar-me por senhorita, mesmo sem saberes se era ou não casada. Algum motivo em especial para tê-lo feito? E, antes que possas sequer pensar que senti-me ofendida, digo que só comentei por ter achado intrigante. Somente por isso.
Sinto-me lisonjeada pelos elogios, sinceramente. E também acredito que não foi somente coincidência o nosso encontro. Afinal, de uma maneira ou de outra, partilhamos uma mesma perda, uma mesma dor. E talvez minhas palavras possam conforta-te, tanto quanto as tuas a mim. Sábios são teus amigos filósofos. Creio que todos eles, não?
Sobre o meu envolvimento com a arte, devo dizer que sou uma amante incansável. Cresci rodeada por livros. Apesar de vir de uma família não muito abastada, incentivos não me faltaram.
Minha mãe me ensinou a tocar piano; que linda voz ela tinha! E meu pai era um artista quando se tratava de madeira. A Inglaterra perdeu um dos seus maiores marceneiros, acredite!
Eternamente apaixonada pela Literatura, não consigo dormir sem ter um livro à cabeceira. Na verdade, só costumo adormecer após ler algumas páginas, escutando o crepitar da vela, que torna o papel ainda mais amarelado. Não sei por que amo tanto essa sensação.
Sinto-me grata pela generosidade. Creio que a única coisa que posso te pedir é que fale-me um pouco da Lílian radiante que ela deve ter sido. Felizmente e infelizmente só a acompanhei em seus últimos momentos, depois de muito debilitada. E quando finalmente se foi, senti como se tivesse perdido muito mais do que supus.
Tens todo o direito de recusar o meu pedido. Mas, em todo o caso, és minha única possibilidade de descobrir o porquê deste sentimento.
De qualquer modo, mais uma vez, obrigada.

Até breve,
Katherine.

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